"Quem és tu que me lês? Sou eu o teu segredo ou és tu o meu?" (Clarice Lispector)

11 abril, 2010

Reescrevendo Manoel Bandeira

Se Manoel Bandeira estivesse vivo e se tivesse presenciado a tragédia fluminense da última semana, certamente reescreveria o seu poema, que passaria a chamar-se O peixe-bicho. E ele seria assim:


O peixe-bicho


Vi ontem um bicho que parecia peixe

Na imundície do alagado
Era arrastado pela enxorrada, lama e detritos.


Quando achava alguma coisa,

Não examinava nem cheirava:
Agarrava-se vorazmente.


O bicho não era um cão,

Não era um peixe,
Não era um rato.


O bicho, meu Deus, era um homem.


Rio, 07 de abril de 2010






(Poema original):

O bicho


Vi ontem um bicho

Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.


Quando achava alguma coisa,

Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.


O bicho não era um cão,

Não era um gato,
Não era um rato.


O bicho, meu Deus, era um homem.
   

Rio, 27 de dezembro de 1947

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